Se houvesse a possibilidade de reviver uma cena do passado eu escolheria uma em que estou com meu pai sentado em nosso paiol de milho. O paiol era todo feito de madeira com tábuas verticais, uma distante da outra uns três centímetros para que fosse arejado, entrasse ar e não estragasse a espiga de milho. Era coberto com telhas com madeiramento como uma casa, com direito a tesoura e tudo, inclusive beiral. Era alto e talvez ficasse a dois metros e meio do chão e seu assoalho também todo de madeira (quando vazio, gostava de ficar batendo o pé naquele assoalho, fazia um barulho gostoso e entrava sol pelas frestas da tábuas fazendo riscos de luz). Embaixo, o que faltava para chegar ao chão era apoiado com paredes de tijolos e alicerces também de tijolos, todo fechado e usado para criar porcos, um chiqueiro com divisões. Esta distância do chão explica-se pela proteção contra umidade e para dificultar os ataques dos ratos.
Assim, ao chegar no paiol era necessário subir por uma escada de madeira com vários degraus e abrir uma porta, também de madeira vertical, algumas cruzadas (um capricho difícil de encontrar), que era fechada por um trinco ou corrente. Eu e meu pai íamos lá, eu deveria ter uns 9 ou 10 anos, sentávamos no meio da porta aberta, atrás era aquela montanha de milho com seu cheiro e poeira característica, meu pai pegava uma espiga, abria, tirava o cabelo do milho, descolava uma boa palha com seu canivete e fazia dois cigarros de palha com recheio de cabelo de milho. Acendia o meu e o dele e ficávamos fumando, fumando...
Quase sinto o cheiro daquela fumacinha que saia do cigarro, a nossa visão do curral com as vacas, um pequeno terreiro para bater o feijão e a calma do meu pai, a gentileza, a educação, as mãos carinhosas.
Boas lembranças nunca apagam, como um bom cigarro de palha de cabelo de milho.